quinta-feira, 20 de setembro de 2012

A Leitura responde a uma necessidade e exige competências mínimas do leitor.


Na formação profissional das pessoas que atuam com incentivo à leitura, muitas vezes, ouve-se o discurso que a leitura não pode ser censurada, que os leitores têm direito de escolher o quê, como, quando e onde ler. Não é o caso, por exemplo, de leituras técnicas solicitadas para investigação de conteúdos trabalhados em sala de aula. A liberdade do leitor fica explícita no texto de  Daniel Pennac sobre os direitos inalienáveis do leitor.

1. Direito de Não Ler
2. Direito de Saltar Páginas
3. Direito de Não Acabar um Livro
4. Direito de Reler
5. Direito de Ler Não Importa o Quê
6. Direito de Amar os «Heróis» dos Romances
7. Direito de Ler Não Importa Onde
8. Direito de Saltar de Livro em Livro
9. Direito de Ler em Voz Alta
10. Direito de Não Falar do Que se Leu

Pennac, Daniel, Como um Romance, Edições Asa, 1993

            Contudo, na prática, nem sempre o leitor tem a garantia de acesso ao que quer ler. Os sensores da sociedade atuam constantemente e de forma, onipresente. Podem ser nossos pais, irmãos, familiares, amigos, colegas, professores e a bibliotecária!  As pessoas tem ideologias e expectativas sobre o que devem ler para ser bons cidadãos:

Tem que ler os clássicos!
Gibis não são livros!
Esse livro não é adequado para a sua faixa etária! 
Esse livro não pode ficar na biblioteca;   
A professora não pode deixar meu filhor ler um livro antes de o ler e ver se é bom.

Isso ocorre fortemente no âmbito da educação básica, especialmente, no Ensino Fundamental. Os livros ainda podem ser vistos com olhares tortos por convidar à reflexão, trazer ideias estranhas ou  mostrar pontos de vistas diferentes daqueles que a família cultiva. É quase como “persona non grata" .
Como lidar com essas questões? A verdade é que, quem atua com o incentivo à leitura, percebe-se, muitas vezes, em situações difíceis, de saia justa! Ter um bom embasamento sobre a leitura e como ela ocorre são bons caminhos, mas vale lembrar que nem sempre os melhores argumentos podem ser aceitos por pessoas com concepção muito rígida sobre determinada coisa. Na dúvida,  sempre vale tentar libertar o leitor!
A questão é: será que o estudantes precisam de filtros para escolher as leituras?
Marc-Alain Ouknin, em seu livro intitulado Biblioterapia, publicado pelas edições Loyola, alguns anos atrás, argumenta que os livros respondem a uma necessidade. Não entramos em uma biblioteca ou livraria e pegamos os livros aleatoriamente para ler. Escolhemos uma obra por identificação, apropriação e projeção como respostas para conflitos, segurança emocional e bem-estar, fuga da realidade, sentimento de pertença, descoberta de outras culturas, valores pessoais...
Por outro lado, a leitura sempre requer competências mínimas dos  leitores. O tipo de linguagem, o tamanho da letras, a estruturação do texto, o estilo do autor, a profundidade dos argumentos, a forma de narração, a ausência ou presença de ilustrações são elementos que podem influenciar no desempenho da leitura. Isso significa que a escolha da obra deve responder a necessidade do leitor e ao mesmo tempo ser acessível a ele.
Um garoto de 8 anos que pretende fazer um empréstimo de Madame Bovary conseguirá lê-lo? Provavelmente, não! Mas, ainda assim, existem mães furiosas com o fato da professora ou bibliotecária ter emprestado “aquele” livro. Se o garoto não vai ler o livro porque emprestá-lo? Ele pode ter a necessidade de mostrar ao colegas que consegue ler um livro com muitas páginas e sem desenho, por exemplo. Ao abrir o livro, verá que a leitura é mais do decodificação do texto, é interpretação, o que exige conhecimento e experiências! Ele voltará à biblioteca para pegar outro livro  e quem sabe, pedirá sugestões de leitura para a bibliotecária?
Por outro lado, uma garotinha de 8 anos ao pegar um livro sobre romance, pode estar entusiasmada com um coleguinha de sala. Coisas de crianças! Se ao passar pelo empréstimo, for censurada por escolher livros que não são adequados, será que voltará a usar a biblioteca ou buscará essas obras de oura maneira?  
A formação do bom leitor ocorre pelas próprias descobertas do que é bom ou ruim. Não é o tipo de coisa que se impõe! É preciso que o leitor tenha contatos com diversos autores, tipos de textos para descobrir o que realmente gosta. E dai, vale exatamente o que o ditado popular afirma “Gosto não se discute”!
Dom Casmurro é considerada uma obra de arte, mas se o leitor não a considera como tal, não há o que fazer. Pode-se até argumentar sobre isso, mas é o leitor quem dará o parecer final.
Pais e educadores que desejam encaminhar os leitores pelo bom caminho deixem os livres para se construírem como leitores. Sugiram títulos, levem-os às bibliotecas e livrarias, contem histórias, mas deixem que eles deem a palavra final: quero ler esse livro!
Não se preocupem, pois  é pouco provável que os aprendizes leiam livros que transcendem as próprias capacidades cognitiva e emocional. Por outro lado, o fato de se sentirem livres para escolher as leituras podem impulsioná-los mais ainda para o mundo da leitura!


Como citar: GASQUE, Kelley Cristine G. D. Gasque. A leitura responde a uma necessidade e exige competencias do leitor. Informar e conhecer. 


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